CARTA ABERTA Projeto de Lei 505/2017


Rafael Teixeira 29/06/2021

No estabelecimento do Estado Democrático de Direito, resultado de um longo processo sócio-histórico e político, a vontade popular é, por natureza, a máxima do desenvolvimento do Estado. Se nos últimos anos assistimos ao avanço de formas de participação democrática, e a sua fundamentação no Estado de direito, mais recentemente, retrocessos, sobretudo no que se refere à participação da sociedade civil, atingem diferentes segmentos.

Nesse sentido, os espaços de controle da política da criança e do adolescente não são uma exceção, de igual modo têm vindo a sofrer impactos. Retrocessos marcados por uma ausência de diálogo entre Estado e sociedade, por uma baixa intensidade das condições de participação popular e por um entendimento estatal, por vezes deslocado do que seja o papel da sociedade civil no controle das políticas públicas. Se o Estado são todos os cidadãos, os Conselhos são os arranjos de organização funcional da sua relação com o povo, constituídos como a forma direta e legítima de participação popular e controle social, e reconhecidos pela função de formulação, mediação e acompanhamento do cumprimento e efetividade das políticas e direitos previstos. Cabe àqueles que ocupam a função de gestão da política pública salvaguardar o melhor interesse da sociedade e o seu envolvimento qualificado nos processos de decisão e nas ações governamentais.

No entanto, corroborando como exemplo da fragilidade da participação social referida, o governo do Estado do Paraná, através da sua Secretaria da Família e Desenvolvimento Social apresentou, unilateralmente, o Anteprojeto de Lei do Sistema Estadual da Política da Criança e do Adolescente do Paraná. Proposta a qual, contrariando os princípios basilares e virtuosos da participação, é apresentada em plenária do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Paraná (CEDCA/PR) tão e somente enquanto informe da respectiva reunião ordinária do mês de agosto de 2017. Ou seja, a proposta não foi inserida como objeto de discussão e análise do conselho, sequer discutida amplamente no momento da sua elaboração, com as estruturas representativas da sociedade civil. Ademais, não respeitada a importância da participação do conselho, o anteprojeto (Projeto de Lei 505/17) é ainda encaminhado à Assembleia Legislativa do Estado do Paraná (ALEP) em caráter de urgência, não tendo sido disponibilizado tempo suficiente para reflexão e deliberação pelo Conselho Estadual.

Ao menos duas razões fundamentais tornam razoável a prevalência de um diálogo mais aberto com a sociedade, e com o CEDCA – PR de modo particular: o objeto do projeto de lei, pois trata especificamente da organização da política da criança e do adolescente no estado do Paraná incidindo diretamente sobre a competência do conselho em deliberar e controlar a sua execução; e a oportunidade de receber contribuições válidas com base em experiências práticas da sociedade e, portanto, a possibilidade de uma lei mais eficaz e adequada às necessidades evidentes.

Cumpre-nos destacar que essas razões não reduzem a pertinência e relevância do tema e da proposta, destacada de forma unânime pelos conselheiros em reunião do CEDCA/PR no dia 18 de agosto de 2017. No entanto, os conselheiros representantes da sociedade civil assinalaram a ausência de debate a respeito.

De modo emergencial, reuniões abertas e públicas foram articuladas pela sociedade civil e OAB/PR – Comissão da Criança e do Adolescente e que se traduziram em momentos fundamentais à consolidação de tão complexa política, para ouvir especialistas nos mais diversos temas quanto a criação de programas como de prevenção, promoção, proteção especial, orientação, socioeducativo, entre outros, previstos no anteprojeto.

Se a participação é o eixo central da cidadania ativa e do controle social das políticas públicas, o desenho das políticas passa primordialmente pela compreensão sistêmica dos anseios de todos os envolvidos, o que torna mais fortalecida a comunidade, e a política em si, pois nasce num processo de base comunitária. Deste modo, os atores que compõe o Sistema de Garantia de Direitos, as organizações da sociedade civil de um modo geral, precisam atentar-se a proposta, principalmente no tocante às disposições referentes às competências, aos programas e ao financiamento.

Diante do exposto, o Fórum DCA/PR enquanto espaço de participação da sociedade no controle social das ações do Estado, utiliza-se da presente para alertar esta casa, a Assembleia Legislativa do Paraná, espaço por essência onde a vontade popular deve emanar, do perigo de se avançar com um Projeto de Lei tão importante sem o devido escrutínio popular. Acreditamos que esta Assembleia poderá agora, fazer a diferença, criando as condições mínimas de reflexão construtiva junto com a sociedade civil. Ao mesmo tempo que o Fórum DCA/PR reforça o movimento já em articulação pela sociedade civil.

Fórum Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Paraná – FDCA/PR