Nota Pública do Fórum dos Direitos da Criança e do Adolescente do Paraná (Fórum DCA/PR) sobre a situação irregular do PPCAAM no Estado


Rafael Teixeira 29/06/2021

Segundo o Índice de Homicídio na Adolescência (IHA)[1], os homicídios representam 36,5% das causas de mortes de adolescentes no país, e estima-se que entre 2013 e 2019 mais de 42mil adolescentes entre 12 e 18 anos poderão ser vítimas de homicídio em municípios com mais de 100mil habitantes (Observatório de Favelas, 2014). O fenômeno da violência letal na adolescência tem vindo a aumentar, o que torna a situação ainda mais alarmante, num contexto nacional de vulnerabilidades e risco social em que manifestações de violência muitas vezes são expressadas como forma de manter e reproduzir relações desiguais de poder e de discriminação de gênero, racial ou de classe social. Por isso, a existência de um Programa de Proteção à Criança e ao Adolescente Ameaçado de Morte (PPCAAM) é de extrema importância, sobretudo porque atende aqueles que se encontram em situação de intensa vulnerabilidade, para lhes assegurar direitos básicos, como o direito à vida.

Não obstante, o atual cenário de desenvolvimento do Programa PPCAAM[2] no Paraná é preocupante. No mês de maio de 2017, o convênio para desenvolvimento do programa no Estado, entre a Secretaria de Justiça e o Governo Federal, foi encerrado. O não cumprimento do prazo instituído para a apresentação dos documentos oficiais somado a morosidade burocrática, são algumas das razões para o seu cancelamento. O encerramento do convênio implicou na finalização do programa, o que significa a desproteção por parte do Estado sobre a vida de adolescentes ameaçados de morte.

Diante da gravidade da situação, também evidenciada em parecer elaborado pela OAB-PR, o CEDCA-PR – Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Estado do Paraná deliberou (Deliberação nº 39/2017) em plenária realizada em junho de 2017, pelo repasse de recursos do FIA/PR em caráter emergencial e excepcional para atender às demandas mais urgentes do PPCAAM, enquanto se tramita o processo de formalização do novo convênio com o Governo Federal. Porém, a complexa e extensa burocracia interna do governo estadual, aliada à fragilidade de comunicação entre os órgãos, contribuíram para que, até a presente data, os recursos deliberados pelo CEDCA ainda não tenham sido repassados à organização social executora do PPCAM no Estado.

Para além das questões burocráticas referidas, do ponto de vista do atendimento, atualmente, as despesas diárias do programa têm sido custeadas com recursos próprios da entidade que o executa. Ademais, os técnicos responsáveis pelo atendimento às crianças, adolescentes e respectivas famílias, em muitos casos, encontram-se sem formalização de contrato laboral, pois tiveram os seus contratos rescindidos em função da inexistência de convênio seja com o governo federal, seja com o governo estadual.

Ao todo, 36 pessoas são atendidas pelo programa no Estado, responsável em assegurar a convivência familiar e proteção integral às crianças e adolescentes testemunhas e ameaçadas de morte. A capacidade do PPCAM atualmente é para atender 40 pessoas, embora a sociedade civil já tenha indicado que este quantitativo é insuficiente para uma adequada abrangência do Programa, e sabe-se da existência de inúmeros casos que se quer foram avaliados. Com efeito, outros 14 casos encontram-se com solicitações pendentes, e devido à complexidade do atual cenário não poderão ser considerados para atendimento, o que reflete um retrato social de absoluta desproteção social e incumprimento dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes.

Importa assinalar que é inadmissível como uma situação desta envergadura tem se prolongada ao longo dos dias e meses, sem perspectivas de solução imediata. Cumpre-nos, por meio desta nota, exigir não só que o processo em tramitação no governo estadual entre as Secretarias de Justiça e da Família e Desenvolvimento Social seja acelerado e todas as medidas necessárias para tal sejam tomadas, como também reivindicar uma resposta efetiva para se fazer face à essa situação. E, ainda, que a sociedade civil seja oficialmente informada de modo a assegurar o adequado controle social pelos coletivos e grupos comprometidos com a defesa dos direitos de todas as crianças e adolescentes, mas em particular daqueles que se encontram em risco de morte.

Portanto, não se trata apenas da resolução das questões burocráticas necessárias para a ativação do convênio, mas, sobretudo, do lugar que crianças e adolescentes em situação de extrema vulnerabilidade e ameaçados de morte têm ocupado na perspectiva do papel do Estado. E ainda, o quanto o sistema burocrático tem sido priorizado em detrimento da proteção integral destas crianças. A proteção e a convivência familiar que lhes é de direito, será tanto mais profícua, quanto maior for a priorização ao tema e a atenção dada aos riscos provenientes da sua invisibilidade.

Fórum dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes do Paraná (Fórum DCA/PR)

[1] Índice desenvolvido no âmbito da parceria entre Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Observatório de Favelas e Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (LAV-Uerj).

[2] No Paraná, o PPCAAM foi instituído pelo decreto nº 6489/2010, para proteção especial a crianças e adolescentes ameaçados de morte ou risco de serem vítimas de homicídio.